Sabia que os morcegos podem ser estudados com ferramentas quase invisíveis no habitat certo? Desde 1947, as redes de neblina têm sido essenciais para pesquisadores que buscam entender esses fascinantes mamíferos voadores.
Neste guia, vamos explorar como capturar diferentes tipos de morcegos usando redes de neblina, uma técnica fundamental para o monitoramento da biodiversidade. Além disso, explicaremos por que esse método é preferido por especialistas em comparação com outras abordagens para estudar morcegos do Brasil, incluindo os hematófagos. É importante destacar que um estudo de 2011 mostrou que as redes de neblina, quando usadas corretamente, resultam em taxas de lesões extremamente baixas (entre 0 e 0,59%) e mortalidade mínima (entre 0 e 0,23%).
Consequentemente, dominar essa técnica não se trata de como eliminar morcegos, mas sim de como estudá-los adequadamente para fins científicos. Durante este guia passo a passo, vamos compartilhar conhecimentos sobre a instalação, monitoramento e manuseio seguro desses animais, garantindo que você esteja preparado para realizar pesquisas eticamente responsáveis com esses importantes componentes do nosso ecossistema.
O que são redes de neblina e por que usá-las?
“Apenas em 1968, Handley apresentou para a comunidade científica as redes de neblina, uma nova técnica de captura de morcegos” — Equipe Editorial PAZ, Editores da revista Papéis Avulsos de Zoologia
As redes de neblina são armadilhas especializadas para capturar animais voadores, criadas há mais de trezentos anos no Japão, onde são conhecidas como *Kasumi-ami*. Atualmente, essas ferramentas são fundamentais para pesquisadores que estudam morcegos em campo.
Como funcionam as redes para morcegos
Essas redes são fabricadas com malha ultrafina de náilon ou poliéster preto, tornando-as praticamente invisíveis quando instaladas corretamente. Funcionam através de um sistema de “prateleiras” criadas por linhas horizontais tensionadas que formam bolsas. Quando um morcego colide com a rede, ele escorrega para dentro dessas bolsas, ficando temporariamente preso.
A eficácia da rede está na sua quase invisibilidade contra a vegetação de fundo. Embora os morcegos possuam ecolocalização, muitos não conseguem detectar as finas fibras da rede, principalmente quando estão bem esticadas em uma única camada. As redes são montadas verticalmente, sustentadas por postes nas extremidades, posicionadas estrategicamente em rotas de voo.
Diferença entre redes para aves e morcegos
Apesar de semelhantes à primeira vista, as redes para morcegos possuem características específicas. O tamanho da malha é determinante: redes com malha de 14mm são ideais para pequenos morcegos, enquanto malhas de 20mm são projetadas para espécies de médio porte. Além disso, as redes para captura de morcegos exigem monitoramento noturno e frequente, já que esses animais são mais hábeis em se libertar e podem danificar a rede.
Outra diferença importante: os morcegos, graças à ecolocalização, tendem a esquivar-se das redes com maior facilidade que as aves. Portanto, técnicas específicas de posicionamento são necessárias para aumentar a eficácia da captura.
Importância para estudos de biodiversidade
As redes de neblina são ferramentas científicas valiosas. Em um estudo realizado no Litoral Norte da Bahia, pesquisadorescapturaram 650 morcegos de 22 espécies diferentes durante dez meses de amostragem. Estes dados são essenciais para compreender a diversidade local e padrões populacionais.
Durante a captura, os pesquisadores podem realizar várias medições morfológicas dos espécimes, como comprimento do braço, tamanho da orelha e peso. Esses dados são fundamentais para identificação das espécies e estudos demográficos.
É importante ressaltar que, no Brasil, o uso de redes de neblina exige licença ambiental do IBAMA/SISBIO, sendo permitido apenas para fins científicos. Quando adequadamente utilizadas, as redes representam um método seguro e ético para o estudo dos morcegos.
Escolhendo o local e o tipo de rede ideal
“As redes de neblina devem ser instaladas não apenas em trilhas e perto de árvores frutíferas, mas também sobre corpos d’água, a fim de aumentar” — Equipe Editorial BJM, Editores do Brazilian Journal of Mammalogy
Para capturar morcegos eficazmente, a localização estratégica das redes de neblina é tão importante quanto o equipamento em si. O sucesso da captura depende principalmente de onde e quando as redes são posicionadas, fatores que influenciam significativamente as taxas de captura.
Identificação de rotas de voo dos morcegos
Os estudos mostram que morcegos seguem padrões de voo específicos. Eles geralmente acompanham linhas de cumeada e montanhas, mantendo uma altitude relativamente constante acima do solo. Surpreendentemente, alguns morcegos adotam um comportamento apelidado pelos pesquisadores de “montanha-russa”, quando disparam para grandes altitudes e descem novamente após poucos minutos.
Os locais mais produtivos para instalação de redes são aqueles utilizados pelos morcegos para deslocamento, como trilhas, riachos e bordas de florestas. Além disso, áreas próximas a pontos de alimentação, como árvores em floração ou frutificação, e coleções de água são extremamente eficientes.
Ao longo de uma rota de voo, deve-se escolher pontos onde obstáculos naturais criam um afunilamento, restringindo o espaço disponível para passagem. Consequentemente, os morcegos tendem a contornar áreas com maiores variações de altitude e preferem voar próximo a corpos hídricos.
Tipos de redes mais usadas no Brasil
No Brasil, as redes de neblina são o método mais empregado em inventários de morcegos, sendo particularmente eficazes para espécies da família Phyllostomidae. Portanto, a escolha adequada da rede é fundamental.
A configuração mais versátil e recomendada para capturar morcegos envolve um tamanho de malha de 36 mm, com 50 ou 70/75 denier e 2 ply. Dessa forma, é possível obter um bom equilíbrio entre resistência e baixa detectabilidade.
Como o tamanho da malha influencia a captura
O tamanho da malha varia conforme a espécie-alvo. Para pequenos morcegos, malhas menores (14-16 mm) são mais eficientes, enquanto para espécies de médio porte, malhas de 20 mm oferecem melhores resultados.
Um fator frequentemente negligenciado é o peso da rede, medido em “denier”. Este representa, em gramas, a massa de 9.000 metros da fibra empregada na construção da rede. Uma rede com 50 denier, por exemplo, tem 9.000 metros de sua fibra pesando 50 gramas. No entanto, redes mais pesadas são mais facilmente detectáveis pelos morcegos através da ecolocalização.
Passo a passo para instalar e usar a rede
A instalação adequada das redes de neblina é crucial para garantir capturas bem-sucedidas e seguras. Após escolher o local ideal, é hora de colocar a mão na obra e montar toda a estrutura necessária.
Montagem da estrutura com tubos e cordas
Primeiramente, instale postes nas extremidades da área escolhida, garantindo que estejam firmemente fixados no solo. Os tubos devem ser rígidos, como PVC, e enterrados cerca de 1-1,5 metros no chão para maior estabilidade. Em seguida, estenda os cabos de tensão entre os postes e ajuste-os para ficarem bem esticados, criando uma grade de suporte.
Posteriormente, passe um arame através da ourela (borda) da rede e fixe-a aos fios do perímetro. É essencial tensionar a rede com força suficiente para evitar que fique frouxa, porém sem exageros que possam danificá-la.
Horários ideais para captura
As redes devem ser armadas antes do pôr do sol, quando os morcegos começam a sair em busca de alimento. Pesquisas mostram que pesquisadores brasileiros concentram suas atividades de coleta na primeira metade da noite, período de maior atividade dos morcegos. No entanto, um estudo realizado no sudeste do Brasil revelou grande similaridade na abundância de espécies tanto na primeira quanto na segunda metade da noite.
Monitoramento e checagem frequente
Durante a captura, é fundamental verificar as redes em intervalos regulares de no máximo 30 minutos. Idealmente, o monitoramento deve ser contínuo para que os animais possam ser removidos imediatamente após a captura. Esta prática reduz significativamente o risco de predação oportunista, estrangulamentos e outros ferimentos.
Como remover morcegos com segurança
A remoção deve ser realizada de forma rápida e cuidadosa. Comece desenredando as asas, que são mais delicadas, e depois o corpo. Se o animal estiver muito emaranhado, pode ser necessário cortar a rede para evitar ferimentos. Vale ressaltar que apenas pessoas treinadas devem realizar este procedimento, pois manipular incorretamente o animal pode causar estresse e lesões como fraturas nos membros.
Ainda, as capturas são frequentemente realizadas com auxílio de redes próximas a abrigos ou junto às fontes alimentares. Em áreas de difícil acesso, utilize puçás como alternativa.
Cuidados, riscos e boas práticas no campo
O trabalho com redes de captura de morcegos requer cuidados específicos para garantir a segurança tanto dos pesquisadores quanto dos animais. A captura de quirópteros está sujeita a regulamentações rigorosas e procedimentos bem estabelecidos por órgãos ambientais.
Evitar predação oportunista
A predação oportunista representa um risco significativo durante a captura. Estudos documentam casos onde morcegos presos em redes foram predados por outros mamíferos, incluindo a cuica d’água (Chironectes minimus), que ataca morcegos nas redes puxando-os para a água. Além disso, quando capturados em redes, os morcegos ficam especialmente vulneráveis, pois seus guinchos atraem predadores oportunistas.
Para minimizar este risco, é essencial verificar as redes em intervalos de 15-20 minutos, conforme recomendado por especialistas. Deste modo, o intervalo entre as vistorias deve ser o menor possível, equilibrando a necessidade de monitoramento com a redução da perturbação ambiental.
Uso de EPIs e manipulação correta
Durante todo o procedimento, é obrigatório o uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) específicos:
- Luvas de raspa de couro de cano longo
- Máscara com filtro de carvão ativado
- Óculos de proteção
- Botas de borracha de cano longo
- Macacão de proteção
Os profissionais que manipulam morcegos devem estar com esquema profilático pré-exposição antirrábico completo e comprovação de titulação anual, conforme normas do Ministério da Saúde.
Permissões legais e ética na captura
No Brasil, a captura de morcegos exige autorização específica dos órgãos ambientais competentes. A legislação brasileira (Lei n. 5.197 de 1967) classifica morcegos como animais silvestres protegidos. Portanto, é necessário:
- Registro no Cadastro Técnico Federal Ambiental (CTFA)
- Anotação de Responsabilidade Técnica (ART)
- Plano de Trabalho detalhado com justificativa da captura
- Licença do IBAMA (Portaria 332 de 13/03/1990)
O manejo não pode implicar em morte ou comprometimento da integridade física dos animais, sendo vedado o uso de substâncias químicas que possam causar dor ou sofrimento.
Como minimizar lesões em morcegos
Durante a captura, é comum ocorrerem injúrias como escoriações no pescoço e antebraço, estrangulamento e rasgos no patágio. Para reduzir estes riscos, o responsável técnico deve garantir o desemaranhamento cuidadoso, removendo primeiro as asas, que são mais delicadas.
Além disso, qualquer comportamento anormal, morte ou lesão deve ser imediatamente reportada às autoridades competentes. Em caso de incidentes, o manejo deve ser interrompido até manifestação do órgão ambiental.
Conclusão
Portanto, a captura de morcegos usando redes de neblina representa uma técnica científica valiosa quando executada com responsabilidade e conhecimento adequados. Consequentemente, pesquisadores que dominam este método conseguem coletar dados essenciais sobre biodiversidade e comportamento dos quirópteros, contribuindo significativamente para a conservação dessas espécies.
Acima de tudo, é fundamental lembrar que este procedimento requer autorizações legais específicas e deve ser realizado exclusivamente para fins científicos. Durante todo o processo, o bem-estar dos animais precisa ser priorizado, com monitoramento constante das redes e manipulação cuidadosa para evitar lesões.
Além disso, a escolha estratégica dos locais de instalação – seja próximo a rotas de voo, áreas de alimentação ou corpos d’água – aumenta consideravelmente a eficácia da captura. Assim sendo, compreender o comportamento dos morcegos torna-se tão importante quanto dominar a técnica de montagem das redes.
Sem dúvida, quando realizada por profissionais treinados e seguindo todos os protocolos de segurança, a captura com redes de neblina representa um método minimamente invasivo e extremamente valioso para o avanço do conhecimento científico sobre esses fascinantes mamíferos voadores. Ao final, o respeito pela legislação ambiental e pelos princípios éticos deve sempre guiar qualquer interação com a fauna silvestre brasileira.
FAQs
1. Como capturar morcegos de forma segura e ética? Para capturar morcegos de forma segura e ética, utilize redes de neblina instaladas em locais estratégicos como rotas de voo e áreas de alimentação. Monitore as redes frequentemente, removendo os animais com cuidado. É essencial ter autorização dos órgos ambientais e seguir protocolos de segurança.
2. Qual o melhor horário para capturar morcegos? O melhor horário para capturar morcegos é logo após o pôr do sol, quando eles começam a sair em busca de alimento. A primeira metade da noite geralmente apresenta maior atividade, mas estudos mostram que a abundância de espécies pode ser similar também na segunda metade.
3. Quais equipamentos de proteção são necessários para manipular morcegos? Para manipular morcegos com segurança, é obrigatório o uso de luvas de raspa de couro de cano longo, máscara com filtro de carvão ativado, óculos de proteção, botas de borracha de cano longo e macacão de proteção. Além disso, é necessário estar com o esquema de vacinação antirrábica em dia.
4. Como escolher o tipo de rede ideal para capturar morcegos? A escolha da rede ideal depende das espécies-alvo. Para pequenos morcegos, use malhas de 14-16 mm. Para espécies médias, malhas de 20 mm são mais eficazes. Uma configuração versátil é a rede com malha de 36 mm, 50 ou 70/75 denier e 2 ply, oferecendo um bom equilíbrio entre resistência e baixa detectabilidade.
5. Quais são os riscos envolvidos na captura de morcegos e como minimizá-los? Os principais riscos incluem predação oportunista, lesões aos animais e exposição dos pesquisadores a doenças. Para minimizá-los, faça verificações frequentes das redes (a cada 15-20 minutos), remova os morcegos cuidadosamente, use equipamentos de proteção adequados e siga rigorosamente os protocolos de segurança e ética estabelecidos pelos órgãos ambientais.
Fique por dentro de todas as novidades! Siga-nos no Instagram – Twitter – Facebook para conteúdos exclusivos e atualizações em tempo real!